Com cautela ele adentrou a mata, desejava afastar-se do cotidiano e dos arranha-céus da grande metrópole. Sentir-se natural, em meio ao verdejante frescor da floresta. Levava consigo um equipamento de primeiro mundo, a barraca mais moderna, comida enlatada e liofilizada, repelentes, inseticidas, raquetes mata-moscas, lanternas que mais pareciam holofotes, colchão inflável, GPS, vídeo-games portáteis, mp3, celular por satélite, praticamente trouxe a cidade consigo.
Achou uma clareira, esterilizou o ambiente e montou seu acampamento. À noite as luzes lembravam um estádio de futebol, e Marcos timidamente esquentava em sua panela uma deliciosa refeição pré-fabricada.
“- Um pouco de água e voilà, está pronto!”
Irrompia o silêncio da noite com suas músicas num volume altíssimo em seu aparelho de mp3.
Empanturrou-se com purê de batatas, estrogonofe de frango, acompanhado de uma grande e gorda garrafa de refrigerante, de sobremesa chocolates e dúzias de outras guloseimas, limpou a boca suja na camisa, afinal ninguém estava ali para lhe ver. Jogou os papeis e embalagens por todo o acampamento, depois ligou seu vídeo game e por algum tempo divertiu-se com seu pequeno brinquedo eletrônico.
Então apagou as luzes, desligou o som e entrou em sua barraca para dormir. E ouviu ruídos dos mais assustadores, ruídos da selva. Tremia debaixo das cobertas jurando que jamais colocaria os pés lá novamente se sobrevivesse a aquela noite. Escutava animais passarem perto da barraca, outros sobrevoarem, sons de galhos sacudindo e quebrando. Queria sair de lá para ver o que estava acontecendo, descobrir o que emitia os horríveis e tenebrosos sons, mas o medo lhe impedia de mexer qualquer músculo.
E num súbito movimento algo rasgou a parte de trás de sua barraca, Marcos rapidamente abriu o zíper que mantinha a porta fechada e correu noite adentro na mata. O caminho era escuro, e a lua crescente iluminava muito pouco para seus olhos acostumados com os postes da cidade. Ao chegar a certo ponto notou sons semelhantes a batidas de tambor, diminuiu o ritmo, a cada passo o som parecia mais alto. E ele estava lá, sozinho na floresta, com frio e medo, perdido e ouvindo ruídos estranhos. Sentou no chão e desesperadamente começou a chorar.
Viu vultos luminosos transpassarem as arvores e os tambores chegarem a seu apogeu sonoro. E parados em seu redor estavam nove índios. Um deles, ancião, coberto por uma pele de urso dirigiu-lhe a palavra:
“- Homem da cidade chora por que teme a natureza. Homem da cidade cria prédio, cria rua, só não cria entendimento. De que o homem da cidade é filho de homem da mata. E que terra é mãe igual de bicho e de gente.”
Nesse momento os tambores voltam com seu som rítmico, Marcos, no chão, praticamente paralisado observa uma dança circular realizada pelos espíritos indígenas em seu redor.
E o índio volta a falar:
“– Mas hoje, homem da cidade vai ver.”
Ditas essas palavras um show de luzes feito aurora boreal começa, elas rodopiam no ar dançando com os índios, e nelas desde pinturas rupestres a animais são vistos.
O índio ancião, com uma espécie de cuia nas mãos, dirige a palavra novamente a Marcos.
“-Este é o sagrado chá de Peyote, antigo ritual faremos.”
Ele entrega o chá a Marcos, que o toma. Começa a sentir-se tonto, as luzes deixam rastros no ar até que tudo vira apenas um clarão branco. E ele se vê em outro lugar. Uma espécie de templo construído em pedra, e os índios estão lá, com ele, sentados.
Marcos vê ao longe duas grandes asas que rapidamente se aproximam, e em sua frente pousa um grande e velho lobo alado. O índio da pele de urso se pronuncia:
“-Este é seu guardião, homem da cidade, de hoje em diante será conhecido como ‘O Lobo Alado’.”
O lobo aproxima-se de Marcos e o cobre com suas asas.
E ambos tornam-se um só.
E ele se lembra do que todos os homens da cidade já esqueceram.
E todo aquele lugar como que por mágica desaparece. Marcos encontra-se deitado no chão, e abre os olhos com o raiar do sol. Volta para seu acampamento, posteriormente para sua cidade.
Conta para amigos e familiares o acontecido, mas todos julgam tratar-se de uma fantasia.
Meses se passam e ninguém mais tem noticias dele, Ana, sua velha amiga vai até sua casa.
Marcos havia deixado a chave debaixo do tapete, ela entra e se depara com um poema escrito na parede:
“Pela janela de uma madrugada qualquer eu vislumbro a Lua
-UIVO-
Por fora sou um homem
Por dentro um lobo-alado
Revelado a mim ao som rítmico de tambores e peyote de xamãs sem nomes e corpos
Num transe transcendental onde suas asas cobriram meu corpo nu
E a real sabedoria oriunda da dor, mostrou-se, em pelo e osso
No olhar velho e cansado de um lobo ja caduco
Que uiva insone insanamente
E se alimenta de carcaças já em decomposição de sonhos esquecidos e corações infartados
O lobo ancião cava o chão fazendo sua própria sepultura
E ao menor deslize engole o Sol e a Lua
E vomita melancolia…
- Marcos A. Bessen, o Lobo Alado.“
Alguns dizem que Marcos, o Lobo Alado ficou louco e suicidou-se, outros que foi para o leste procurar seu verdadeiro clã sob os olhos protetores de Wabun.
Achou uma clareira, esterilizou o ambiente e montou seu acampamento. À noite as luzes lembravam um estádio de futebol, e Marcos timidamente esquentava em sua panela uma deliciosa refeição pré-fabricada.
“- Um pouco de água e voilà, está pronto!”
Irrompia o silêncio da noite com suas músicas num volume altíssimo em seu aparelho de mp3.
Empanturrou-se com purê de batatas, estrogonofe de frango, acompanhado de uma grande e gorda garrafa de refrigerante, de sobremesa chocolates e dúzias de outras guloseimas, limpou a boca suja na camisa, afinal ninguém estava ali para lhe ver. Jogou os papeis e embalagens por todo o acampamento, depois ligou seu vídeo game e por algum tempo divertiu-se com seu pequeno brinquedo eletrônico.
Então apagou as luzes, desligou o som e entrou em sua barraca para dormir. E ouviu ruídos dos mais assustadores, ruídos da selva. Tremia debaixo das cobertas jurando que jamais colocaria os pés lá novamente se sobrevivesse a aquela noite. Escutava animais passarem perto da barraca, outros sobrevoarem, sons de galhos sacudindo e quebrando. Queria sair de lá para ver o que estava acontecendo, descobrir o que emitia os horríveis e tenebrosos sons, mas o medo lhe impedia de mexer qualquer músculo.
E num súbito movimento algo rasgou a parte de trás de sua barraca, Marcos rapidamente abriu o zíper que mantinha a porta fechada e correu noite adentro na mata. O caminho era escuro, e a lua crescente iluminava muito pouco para seus olhos acostumados com os postes da cidade. Ao chegar a certo ponto notou sons semelhantes a batidas de tambor, diminuiu o ritmo, a cada passo o som parecia mais alto. E ele estava lá, sozinho na floresta, com frio e medo, perdido e ouvindo ruídos estranhos. Sentou no chão e desesperadamente começou a chorar.
Viu vultos luminosos transpassarem as arvores e os tambores chegarem a seu apogeu sonoro. E parados em seu redor estavam nove índios. Um deles, ancião, coberto por uma pele de urso dirigiu-lhe a palavra:
“- Homem da cidade chora por que teme a natureza. Homem da cidade cria prédio, cria rua, só não cria entendimento. De que o homem da cidade é filho de homem da mata. E que terra é mãe igual de bicho e de gente.”
Nesse momento os tambores voltam com seu som rítmico, Marcos, no chão, praticamente paralisado observa uma dança circular realizada pelos espíritos indígenas em seu redor.
E o índio volta a falar:
“– Mas hoje, homem da cidade vai ver.”
Ditas essas palavras um show de luzes feito aurora boreal começa, elas rodopiam no ar dançando com os índios, e nelas desde pinturas rupestres a animais são vistos.
O índio ancião, com uma espécie de cuia nas mãos, dirige a palavra novamente a Marcos.
“-Este é o sagrado chá de Peyote, antigo ritual faremos.”
Ele entrega o chá a Marcos, que o toma. Começa a sentir-se tonto, as luzes deixam rastros no ar até que tudo vira apenas um clarão branco. E ele se vê em outro lugar. Uma espécie de templo construído em pedra, e os índios estão lá, com ele, sentados.
Marcos vê ao longe duas grandes asas que rapidamente se aproximam, e em sua frente pousa um grande e velho lobo alado. O índio da pele de urso se pronuncia:
“-Este é seu guardião, homem da cidade, de hoje em diante será conhecido como ‘O Lobo Alado’.”
O lobo aproxima-se de Marcos e o cobre com suas asas.
E ambos tornam-se um só.
E ele se lembra do que todos os homens da cidade já esqueceram.
E todo aquele lugar como que por mágica desaparece. Marcos encontra-se deitado no chão, e abre os olhos com o raiar do sol. Volta para seu acampamento, posteriormente para sua cidade.
Conta para amigos e familiares o acontecido, mas todos julgam tratar-se de uma fantasia.
Meses se passam e ninguém mais tem noticias dele, Ana, sua velha amiga vai até sua casa.
Marcos havia deixado a chave debaixo do tapete, ela entra e se depara com um poema escrito na parede:
“Pela janela de uma madrugada qualquer eu vislumbro a Lua
-UIVO-
Por fora sou um homem
Por dentro um lobo-alado
Revelado a mim ao som rítmico de tambores e peyote de xamãs sem nomes e corpos
Num transe transcendental onde suas asas cobriram meu corpo nu
E a real sabedoria oriunda da dor, mostrou-se, em pelo e osso
No olhar velho e cansado de um lobo ja caduco
Que uiva insone insanamente
E se alimenta de carcaças já em decomposição de sonhos esquecidos e corações infartados
O lobo ancião cava o chão fazendo sua própria sepultura
E ao menor deslize engole o Sol e a Lua
E vomita melancolia…
- Marcos A. Bessen, o Lobo Alado.“
Alguns dizem que Marcos, o Lobo Alado ficou louco e suicidou-se, outros que foi para o leste procurar seu verdadeiro clã sob os olhos protetores de Wabun.